07/04/2025

Salmo 140 - Biblia Online



Fonte: https://www.bibliaonline.com.br/acf/sl/140



 1 Livra-me, ó Senhor, do homem mau; guarda-me do homem violento,

2 Que pensa o mal no coração; continuamente se ajuntam para a guerra.

3 Aguçaram as línguas como a serpente; o veneno das víboras está debaixo dos seus lábios. (Selá.)

4 Guarda-me, ó Senhor, das mãos do ímpio; guarda-me do homem violento; os quais se propuseram transtornar os meus passos.

5 Os soberbos armaram-me laços e cordas; estenderam a rede ao lado do caminho; armaram-me laços corrediços. (Selá.)

6 Eu disse ao Senhor: Tu és o meu Deus; ouve a voz das minhas súplicas, ó Senhor.

7 Ó Deus o Senhor, fortaleza da minha salvação, tu cobriste a minha cabeça no dia da batalha.

8 Não concedas, ó Senhor, ao ímpio os seus desejos; não promovas o seu mau propósito, para que não se exalte. (Selá.)

9 Quanto à cabeça dos que me cercam, cubra-os a maldade dos seus lábios.

10 Caiam sobre eles brasas vivas; sejam lançados no fogo, em covas profundas, para que se não tornem a levantar.

11 Não terá firmeza na terra o homem de má língua; o mal perseguirá o homem violento até que seja desterrado.

12 Sei que o Senhor sustentará a causa do oprimido, e o direito do necessitado.

13 Assim os justos louvarão o teu nome; os retos habitarão na tua presença.



01/04/2025

A ciência da superstição


 Fonte: https://revistaplaneta.com.br/a-ciencia-da-supersticao/

Redação - 12/11/2022 - 9:00


Entrar com o pé direito, evitar gatos negros, bater na madeira - em certas circunstâncias, a superstição pode até ser benéfica


Observe atletas de esportes coletivos como futebol, vôlei ou basquete antes de entrarem no campo de jogo: é quase certo que pelo menos um deles vai fazer questão de colocar primeiro o pé direito dentro das quatro linhas. O gesto, que concretiza a expressão “entrar com o pé direito”, supostamente vai garantir ao esportista que nada de ruim lhe acontecerá na disputa.


Muitas outras crenças como essa, destinadas a afastar o azar e/ou a trazer sorte, estão espalhadas pelo mundo. São as superstições, algumas delas bastante populares: quem não ouviu falar, por exemplo, de bater na madeira, evitar gatos pretos e não passar por baixo de escadas?


Manifestações de uma relação equivocada de causa e efeito, as superstições nasceram quando o homem ganhou a capacidade de discernimento e, ao longo da história, não pouparam ninguém: negros, brancos, amarelos, ricos, pobres, Primeiro ou Terceiro Mundo, praticamente não há segmento que escape delas. O tema atraiu o interesse do biólogo evolucionista Kevin Foster, da Universidade Harvard, e de sua colega Hanna Kokko, da Universidade de Helsinque (Finlândia), que divulgaram uma pesquisa sobre como o comportamento supersticioso pode se desenvolver. Entre suas conclusões, uma surpresa para os mais céticos: em certas circunstâncias, a superstição é benéfica.


Escolha em meio a incertezas

“Num mundo de incertezas, você tem de escolher se acredita ou não acredita”, afirma Foster. Segundo a definição usada por ele e Hanna, superstição é acreditar que uma coisa causou outra, mesmo se não há evidência para isso. “Portanto, se seu horóscopo diz que os planetas estão no alinhamento correto para novas revelações e seu parceiro conseguiu uma promoção, você tenderá a acreditar no astrólogo que escreveu aquelas previsões”, afirma o biólogo – que, cartesianamente, encaixou a astrologia (e também as medicinas alternativas) no rol de superstições.


Para sua pesquisa, Foster e Hanna aplicaram a linguagem matemática a um contexto biológico. Interessava-lhes determinar exatamente quando alguma dessas falsas conexões traria prejuízo à pessoa. A conclusão dos cientistas foi que, enquanto o custo de acreditar numa superstição for menor do que o de perder uma associação verdadeira, a crença supersticiosa vai vencer.


Tal gesto tem muito a ver com o instinto de sobrevivência, explica Foster: “Todos os animais apresentam comportamentos os quais implicam uma relação causal que não está lá.” Os pombos servem de exemplo: voam para longe a um bater de palmas, mas têm condições de diferenciar esse ruído do de um tiro de espingarda, que de fato poderia matá-los. Mesmo assim, eles preferem fugir – é melhor ficar a salvo do que gastar tempo tratando de feridas depois.


Processo ancestral

Foster transpôs essa ideia para o exemplo de um humano pré-histórico em meio ao capim alto, de onde em certo momento ouve-se um farfalhar. As explicações instantâneas do nosso antepassado para o fato seriam um grupo de leões à espreita ou o vento soprando. A segunda hipótese teria chances muito maiores de ser a correta – mas, “se um grupo de leões está vindo, há um enorme benefício em não estar por perto”, observa o biólogo. Daí a associar o farfalhar da relva a um apelo por segurança urgente não custaria muito. (Elementos adicionais no quadro, como uma lua cheia ou nuvens baixas no céu, reforçariam ainda mais a montagem da superstição.) Como consequência natural dessa atitude, os humanos que fugiam quando a grama alta farfalhava tinham mais chance de sobreviver e passar seus genes adiante – o que abre, inclusive, a possibilidade de que exista um gene ligado à superstição.


“Ser supersticioso faz sentido num mundo de incertezas”, observa Foster. As espécies supersticiosas – reagindo como se houvesse um predador à espreita quando aquele predador está extinto, digamos – tendem a se preservar mais do que as que não tão cautelosas. Esse processo ancestral, que exige respostas imediatas a aparentes ameaças, não chegou a ser abolido no homem por suas conquistas evolutivas. “Nossa análise sugere que os efeitos culturais são modelados por uma tendência desenvolvida de associar eventos tão rapidamente que as pessoas frequentemente cometem erros supersticiosos”, comenta o biólogo. Para ele, porém, esse procedimento tende a se tornar cada vez mais racional com o passar do tempo, pois “acreditar em coisas a respeito das quais não temos evidência científica é menos benéfico do que costumava ser antes”.


Definição estreita

Ao avaliar as ideias de Foster e Hanna, Bruce Hood, psicólogo experimental da Universidade de Bristol (Grã-Bretanha) e autor do livro SuperSense: Why We Believe the Unbelievable (SuperSentido: Por Que Acreditamos no Inacreditável), lançado em 2009, lamentou a definição “estreita” de superstição adotada pela dupla e a ausência de observações sobre a psicologia da crença supersticiosa – além, é claro, das especulações sobre a existência de um gene da superstição. “Os humanos nascem com cérebros desenhados para extrair sentido do mundo, e isso algumas vezes leva a crenças que vão além de qual quer explicação natural”, disse Hood ao jornal inglês The Independent.


Outra crítica, feita pelo biólogo evolucionista Wolfgang Forstmeier, do Instituto de Ornitologia Max Planck, na Alemanha, aborda um ângulo inesperado da questão. Ouvido pela revista científica inglesa New Scientist, Forstmeier afirmou que, por freqüentemente ligar causa e efeito de modo falso, a ciência não passa de uma forma dogmática de superstição. “Você tem de escolher entre ser supersticioso e ser ignorante”, diz. Ao ignorarem evidências consistentes contrárias a idéias que cultivam há vários anos, “muitos cientistas tendem a ser ignorantes com grande freqüência”, critica o biólogo. Nesse sentido, uma advertência de Hood deve ser constantemente lembrada: “O que é magia hoje pode se tornar ciência amanhã.”


Crenças e suas origens

Sexta-feira 13 – Duas lendas nórdicas estariam por trás da crença de que essa data é negativa. A primeira delas trata de um banquete para 12 convidados organizado no Valhala (morada celestial das divindades). Loki, espírito do mal e da discórdia, apareceu sem ser convidado e armou uma briga na qual Balder, filho do deus supremo, Odin, veio a falecer. Com isso, o número 13 ficou marcado como símbolo do azar.


A outra lenda está ligada a Friga, deusa do amor e da fertilidade, esposa de Odin e mãe de Balder, cujo nome originou as palavras friadagr e Friday (“sexta-feira” em norueguês e inglês, respectivamente). No processo de conversão dos povos nórdicos ao cristianismo, Friga foi transformada em uma bruxa que se exilou no alto de uma montanha. Querendo vingança, ela passou a se reunir todas as sextas-feiras com outras 11 feiticeiras, além do próprio Satanás – num total de 13 participantes –, para lançar pragas sobre a humanidade.

Pé de coelho – Presente no folclore afro-americano, o pé de coelho traria sorte porque, na verdade, corresponderia ao pé de uma bruxa transformada nesse animal. Pela crença, a pata tinha de ser a esquerda traseira de um coelho baleado ou capturado num cemitério.

Escada – A escada representa a elevação, a ascensão social, e quem passa por baixo dela simbolicamente renuncia ao sucesso.

Gato preto – O medo de gatos pretos surgiu na Idade Média, quando os hábitos noturnos desses animais levaram alguns a imaginar que eles tinham um pacto com o demônio. Os pêlos negros eram relacionados às trevas.

Bater na madeira – Para os pagãos, as árvores eram moradas dos deuses. Povos como os celtas batiam nos troncos para chamar o poder divino e afastar maus espíritos.

Entrar com o pé direito – Na época do Império Romano, os sacerdotes instruíam os convidados que fossem adentrar um salão a entrar com o pé direito a fim de evitar má sorte. Antes dos romanos, povos como os egípcios, os celtas e os gregos já viam o lado direito como positivo e associado a bons augúrios, em oposição ao esquerdo. (Já no Extremo Oriente, o lado esquerdo é considerado favorável.)

Osso da sorte – A crença de que a fúrcula da galinha traz sorte vem da Etrúria. Quando duas pessoas faziam um pedido e quebravam a fúrcula, quem ficava com a parte maior teria mais sorte.


15/03/2025

O Mercador de Sal e o Burro


Quem com ferro fere...



Fonte: https://fabulasdeesopos.blogspot.com/2012/10/o-mercador-de-sal-e-o-burro.html


Um mercador de sal levou seu burro à beira-mar, para comprar sal. Carregou a garupa do burro de cestas de sal e tocou-se com ele para casa. No caminho, atravessaram um riacho. O burro escorregou e caiu dentro d'água. Quando conseguiu levantar-se, achou que o peso da carga estava muito menor, porque grande quantidade de sal se dissolvera na água.

  O mercador voltou à beira-mar e reencheu as cestas. De regresso à casa, o burro novamente caiu dentro do riacho. Desta vez, porém, tinha feito de propósito.

O mercador compreendeu a intenção do burro mas não disse nada. Levou-o novamente junto ao mar e, disfarçadamente, colocou dentro das cestas um  carregamento de esponjas.

Quando chegaram junto do riacho, o burro tratou de cair mais uma vez. E então as esponjas se encharcaram d'água, de tal modo que, em vez de a carga do burro ficar aliviada, dobrou de peso.

Moral de História - "Quem com ferro fere, com ferro será ferido."

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Em outros links: https://contrapontosocial.wordpress.com/2017/05/18/o-mercador-de-sal-e-o-burro/


10/03/2025

O Barril de Amontillado - Conto de Edgar Allan Poe

 




 Suportara eu, enquanto possível, as mil ofensas de Fortunato, mas quando se aventurou ele a insultar-me, jurei me vingar. Vós que tão bem conheceis a natureza de minha alma, não havereis de supor, porém, que proferi alguma ameaça. Afinal, eu deveria vingar-me. Isto era um ponto definitivamente assentado, mas essa resolução definitiva excluía a ideia de risco. Eu devia não só punir, mas punir com impunidade. Não se desagrava uma injúria, quando o castigo recai sobre o desagravante. O mesmo acontece quando o vingador deixa de fazer sentir sua qualidade de vingador a quem o injuriou.

Fica logo entendido que nem por palavras, nem por fatos, dera eu causa a Fortunato de duvidar de minha boa vontade. Continuei, como de costume a fazer-lhe cara alegre, e ele não percebia que meu sorriso agora se originava da ideia de sua imolação.

O Fortunato tinha o seu lado fraco, embora, a outros respeitos, fosse um homem acatado e até temido. Orgulhava-se de ser conhecedor de vinhos. Poucos italianos têm o verdadeiro espírito do "conhecedor". Na maior parte, seu entusiasmo adapta-se às circunstâncias do momento e da oportunidade, para ludibriar milionários ingleses e austríacos. 
Em matéria de pintura e ourivesaria era Fortunato, semelhante a seus patrícios, um impostor, mas em assunto de vinhos velhos era sincero. A este respeito, éramos da mesma força. Considerava-me muito entendido em vinhos italianos, e, sempre que podia, comprava-os em larga escala.

Foi ao escurecer duma tarde, durante o supremo delírio carnavalesco, que encontrei meu amigo. Abordou-me com excessivo ardor, pois já estava bastante bebido. Estava fantasiado, com um traje apertado e listado, trazendo na cabeça uma carapuça cônica, cheia de guizos. Tão contente fiquei ao vê-lo, que não cessava de apertar-lhe a mão. E disse-lhe:

— Meu caro Fortunato, foi uma felicidade encontrá-lo. Como está você bem-disposto hoje! Mas recebi uma pipa dum vinho, dado como Amontillado, e tenho minhas dúvidas.

— Como? — disse ele. — Amontillado? Uma pipa? Impossível. E no meio do carnaval!

— Tenho minhas dúvidas — repliquei —, mas fui bastante tolo em pagar o preço total do amontillado, sem antes consultar você. Não consegui encontrá-lo e tinha receio de perder uma pechincha.

— Amontillado!

— Tenho minhas dúvidas.

— Amontillado!

— É preciso desfazê-las.

— Amontillado!

— Se você não estivesse ocupado... Estou indo à casa de Luchesi. Se há alguém que entenda disso, é ele. Terá de dizer-me...

— Luchesi não sabe diferençar um Amontillado dum Xerez.

— No entanto, há uns bobos que dizem por aí que, em matéria de vinhos, vocês se equiparam.

— Pois então vamos.

— Para onde?

— Para sua adega.

— Não, meu amigo. Não quero abusar de sua boa vontade. Vejo que você está ocupado. Luchesi...

— Não estou ocupado coisa nenhuma... Vamos.

— Não, meu amigo. Não é por isso, mas é que vejo que você está fortemente resfriado. A adega está duma umidade intolerável. Suas paredes estão incrustadas de salitre.

— Não tem importância, vamos. Um resfriado à-toa. Amontillado! Acho que você foi enganado. Quanto a Luchesi, é incapaz de distinguir um Xerez dum Amontillado.

Assim falando, Fortunato agarrou-me o braço. Pondo no rosto uma máscara de seda e enrolando-me num capote, deixei-me levar por ele, às pressas, na direção do meu palácio.




Todos os criados haviam saído para se divertirem no carnaval. Dissera-lhes que só voltaria de madrugada e dera-lhes explícitas ordens para não se afastarem de casa. Foi, porém, o bastante, bem o sabia, para que se sumissem, logo que virei as costas.

Peguei dois archotes, um dos quais entreguei a Fortunato, e conduzi-o através de várias salas até a passagem abobadada, que levava à adega. Desci à frente dele uma longa e tortuosa escada, aconselhando-o a ter cuidado. Chegamos por fim ao sopé e ficamos juntos, no chão úmido das catacumbas dos Montresors.



Meu amigo cambaleava e os guizos de sua carapuça tilintavam, a cada passo que dava.

— Onde está a pipa? — perguntou ele.

— Mais para o fundo — respondi —, mas repare nas teias cristalinas que brilham nas paredes desta caverna.

Ele voltou-se para mim e fitou-me bem nos olhos, com aqueles seus dois glóbulos vítreos que destilavam a reuma da bebedice.

— Salitre? — perguntou ele, por fim.

— É, sim — respondi. — Há quanto tempo está você com essa tosse?

— Eh! Eh! Eh! Eh! Eh! Eh! Eh! — pôs-se ele a tossir e durante muitos minutos não conseguiu meu pobre amigo dizer uma palavra.

— Não é nada — disse ele, afinal.

— Venha — disse eu, decidido. — Vamos voltar. Sua saúde é preciosa. Você é rico, respeitado, admirado, amado. Você é feliz, como eu era outrora. Você é um homem que faz falta. Quanto a mim, não. Voltemos. Você pode piorar e não quero ser responsável por isso. Além do que, posso recorrer a Luchesi...

— Basta! — disse ele. — Esta tosse não vale nada. Não me há de matar. Não é de tosse que hei de morrer.

— Isto é verdade... isto é verdade — respondi — e de fato, não era minha intenção alarmá-lo sem motivo. Mas acho que você deveria tomar toda a precaução. Um gole deste Médoc nos defenderá de umidade.

Então fiz saltar o gargalo duma garrafa, que retirei duma longa fileira empilhada no chão.

— Beba — disse eu, apresentando-lhe o vinho.

Levou a garrafa aos lábios com um olhar malicioso. Calou-se um instante e me cumprimentou com familiaridade, fazendo tilintarem os guizos.

— Bebo pelos defuntos que repousam em torno de nós — disse ele.

— E eu para que você viva muito.

Pegou-me de novo pelo braço e prosseguimos.

— Estas adegas são enormes — disse ele.

— Os Montresors eram uma família rica e numerosa — respondi.

— Não me lembro quais são suas armas.

— Um enorme pé humano dourado, em campo blau; o pé esmaga urna serpente rastejante, cujos colmilhos se lhe cravam no calcanhar.

— E qual é a divisa?

 Nemo me impune lacessit.

— Bonito! — disse ele.

O vinho faiscava-lhe nos olhos e os guizos tilintavam. Minha própria imaginação se aquecia com o Médoc. Havíamos passado diante de paredes de ossos empilhados, entre barris e pipotes, até os recessos extremos das catacumbas. Parei de novo e desta vez atrevi-me a pegar Fortunato por um braço, acima do cotovelo.

— O salitre! Veja, está aumentado. Parece musgo agarrado às paredes. Estamos em baixo do leito do rio. As gotas de umidade filtram-se entre os ossos. Venha, vamos antes que seja demasiado tarde. Sua tosse...

— Não é nada — disse ele. — Continuemos. Mas antes dê-me outro gole de Médoc.




Quebrei o gargalo duma garrafa de De Grave e entreguei-lhe. Esvaziou-a dum trago. Seus olhos cintilavam, ardentes. Riu e jogou a garrafa para cima, com um gesto que eu não compreendi.

Olhei surpreso para ele. Repetiu o grotesco movimento.

— Não compreende? — perguntou.

— Não.

— Então não pertence à irmandade?

— Que irmandade?

— Você não é maçom?

— Sim, sim, sim, sim — respondi.

— Você? Maçom? Não é possível.

— Sou maçom, sim.

— Mostre o sinal — disse ele.

— É este — respondi, retirando de sob as dobras de meu capote uma colher de pedreiro.

— Você está brincando — exclamou ele, dando uns passos para trás. — Mas vamos ver o Amontillado.

— Pois vamos — disse eu, recolocando a colher debaixo do capote e oferecendo-lhe, de novo, meu braço, sobre o qual se apoiou ele pesadamente. Continuamos o caminho em busca do Amontillado. Passamos por uma série de baixas arcadas, demos voltas, seguimos para a frente, descemos de novo e chegamos a uma profunda cripta, onde a impureza do ar reduzia a chama de nossos archotes a brasas avermelhadas.

No recanto mais remoto da cripta, outra se descobria menos espaçosa. Nas suas paredes alinhavam-se restos humanos, empilhados até o alto da abóbada, à maneira das grandes catacumbas de Paris. Três lados dessa cripta interior estavam assim ornamentados. Do quarto haviam sido afastados os ossos, que jaziam misturados no chão, formando em certo ponto um montículo de avultado tamanho. Na parede assim desguarnecida dos ossos, percebemos um outro nicho, com cerca de quatro pés de profundidade, três de largura e seis ou sete de altura. Não parecia ter sido escavado para um uso especial, mas formado simplesmente pelo intervalo entre dois dos colossais pilares de teto das catacumbas e tinha como fundo uma das paredes de sólido granito, que os circunscreviam. Foi em vão que Fortunato, erguendo a tocha mortiça, tentou espreitar a profundeza do recesso. A fraca luz não nos permitia ver-lhe o fim.

— Vamos — disse eu —, aqui está o Amontillado. Quanto a Luchesi...

— É um ignorantaço! — interrompeu meu amigo, enquanto caminhava, vacilante, para diante e eu o acompanhava rente aos seus calcanhares. Sem demora alcançou ele a extremidade do nicho e, não podendo mais prosseguir, por causa da rocha, ficou estupidamente apatetado. Um momento mais e ei-lo acorrentado por mim ao granito. Na sua superfície havia dois anéis de ferro, distando um do outro cerca de dois pés, horizontalmente. De um deles pendia curta cadeia e do outro um cadeado. Passar-lhe a corrente em torno da cintura e prendê-lo, bem seguro, foi obra de minutos. Estava por demais atônito para resistir. Tirando a chave, saí do nicho.

— Passe sua mão — disse eu — por sobre a parede; não poderá deixar de sentir o salitre. É de fato bastante úmido. Mais uma vez permita-me implorar-lhe que volte. Não? Então devo positivamente deixá-lo. Mas é preciso primeiro prestar-lhe todas as pequeninas atenções que puder.

— O Amontillado! — vociferou meu amigo, ainda não recobrado do espanto.

— É verdade — repliquei —, o Amontillado.

Ao dizer estas palavras pus-me a procurar as pilhas de ossos, a que me referi antes. Jogando-os para um lado, logo descobri grande quantidade de tijolos e argamassa. Com estes materiais e com o auxílio de minha colher de pedreiro, comecei com vigor a emparedar a entrada do nicho.

Mal havia eu começado a acamar a primeira fila de tijolos, descobri que a embriaguez de Fortunato se tinha dissipado em grande parte. O primeiro indício disto que tive foi um surdo lamento, lá do fundo do nicho. Não era o choro de um homem embriagado. Seguiu-se então um longo e obstinado silêncio. Deitei a segunda camada, a terceira e a quarta e depois ouvi as furiosas vibrações da corrente. O barulho durou vários minutos, durante os quais, para gozá-lo com maior satisfação, interrompi meu trabalho e me sentei em cima dos ossos. Quando afinal o tilintar cessou, tornei a pegar na colher e acabei sem interrupção a quinta, a sexta e a sétima camadas. A parede estava agora quase ao nível de meu peito. Parei de novo e, levantando o archote por cima dela, lancei uns poucos e fracos raios sobre o rosto dentro do nicho. Uma explosão de berros fortes e agudos, provindos da garganta do vulto acorrentado, me fez recuar com violência. Durante um breve momento hesitei. Tremia. Desembainhando minha espada, comecei a apalpar com ela em torno do nicho, mas uns instantes de reflexão me tranquilizaram. Coloquei a mão sobre a alvenaria sólida das catacumbas e senti-me satisfeito. Reaproximei-me da parede. Respondi aos urros do homem. Servi-lhe de eco... ajudei-o a gritar... ultrapassei-o em volume e em força. Fui fazendo assim e por fim cessou o clamor.

Era agora meia-noite e meu serviço chegara ao termo. Completara a oitava, a nona e a décima camadas. Tinha acabado uma porção desta última e a décima primeira. Faltava apenas uma pedra a ser colocada e argamassada. Carreguei-a com dificuldade por causa do peso. Coloquei-a, em parte, na posição devida. Mas então irrompeu de dentro do nicho uma enorme gargalhada, que me fez eriçar os cabelos. Seguiu-se-lhe uma voz lamentosa, que tive dificuldade em reconhecer como a do nobre Fortunato. A voz dizia:

— Ah! Ah! Ah!... Eh! Eh! Eh!... Uma troca bem boa de fato... uma excelente pilhéria. Haveremos de rir a bandeiras despregadas lá no palácio... Eh! Eh! Eh!... a respeito desse vinho... Eh! Eh! Eh!

— O Amontillado! — exclamei eu.

— Eh! Eh! Eh!... Eh! Eh! Eh!... Sim, o Amontillado. Mas já não será tarde? Já não estarão esperando por nós, no palácio, minha mulher e os outros? Vamos embora.

— Sim — disse eu —, vamos embora.

 Pelo amor de Deus, Montresor!

— Sim — disse eu —, pelo amor de Deus!

Aguardei debalde uma resposta a essas palavras. Impacientei-me. Chamei em voz alta:

— Fortunato!

Nenhuma resposta. Chamei de novo:

— Fortunato!

Nenhuma resposta ainda. Lancei uma tocha, através da abertura remanescente, e deixei-a cair lá dentro. Como resposta ouvi apenas o tinir dos guizos. Senti um aperto no coração... devido talvez à umidade das catacumbas. Apressei-me em terminar meu trabalho. Empurrei a última pedra em sua posição. Argamassei-a. Contra a nova parede, reergui a velha muralha de ossos. Já faz meio século que mortal algum os remexeu. In pace requiescat!



19/02/2025

Cebolinha: HQ "O plano da calcinha de rendinha"

 Fonte: https://arquivosturmadamonica.blogspot.com/2025/02/cebolinha-hq-o-plano-da-calcinha-de-rendinha.html


Cebolinha cria um plano infalível de dar vergonha à Mônica de saber que fica com calcinha à mostra quando vai bater nos meninos. Com 8 páginas, foi publicada em 'Cebolinha Nº 11' (Ed. Globo, 1987).














15/02/2025

Nico Demo: O personagem esquecido da Turma da Mônica

 

Nico Demo


Fonte:  https://arquivosturmadamonica.blogspot.com/2014/03/personagens-esquecidos-6-nico-demo.html


Nico Demo foi um personagem incorreto criado ainda nas tiras de jornais e que se enquadra na galeria de personagens esquecidos. Nessa postagem, falo sobre ele.

Criado em 1966 em tiras do "Jornal da Tarde", de São Paulo, ele era um garoto levado com um humor sarcástico. Tinha um cabelo que se parecia com chifres e se vestia com roupas pretas bem formais. Ele era um capeta em pessoa, dai o nome Nico Demo, de demônio. Fazia o tipo de bom coração, com a intenção de sempre querer ajudar os outros, mas acabava atrapalhando em vez de ajudar, causando muitas confusões. 

Até ficava a dúvida do leitor se ele tinha mesmo a boa intenção ou se ele realmente queria aprontar com os outros. Era uma coisa muito comum nas tiras e histórias feitas pelo Mauricio do leitor usar a imaginação, interpretando como quisesse, e com o Nico Demo não era diferente.


 Este é o Dossiê - Nico-Demo-50-Dossie-Secreto

https://www.deviantart.com/saphytrix/art/Nico-Demo-50-Dossie-Secreto-668803670


Descobri este dossiê no Site Associação de Quadrinhistas e Caricaturistas do Estado de São Paulo no post Entrevista com Bia Kassar.